Palácio da Pena: visita ao interior apenas com data e hora marcada, indicadas no seu bilhete; não existe tolerância de atraso. Saiba mais

A Gatita da Rainha. Como a queda da monarquia separou D. Amélia da sua melhor amiga de quatro patas

05 ago. 2024

Os monumentos de Sintra fazem parte da História de Portugal, mas são as suas ‘pequenas’ histórias que lhes dão vida. Hoje vamos conhecer a da ‘Gatita da rainha’.

 

Se foi este o nome que recebeu à nascença, não sabemos, mas era por ‘Gatita’ que D. Amélia a tratava. Segundo a crónica escrita por Augusto Barreto, primeiro almoxarife do Palácio da Pena, em 1911 – já depois da queda da monarquia – no jornal ‘O Concelho de Cintra’, a rainha gostava de mimar a sua gata: tinha uma coleira de prata com o nome ‘Amélia’ gravado, gostava de bons petiscos – como “o gostoso camarão da Barra e o fino gateau britânico” – e, claro, era acarinhada todos os dias pela sua dona.

 

D. Amélia foi a última soberana a habitar o Palácio da Pena – era onde se encontrava na manhã de 5 de outubro de 1910, dia da Implantação da República, e dali partiu para o exílio. A Gatita acabou por ficar para trás, num enorme palácio, sempre na esperança de voltar a ver a sua dona. “Todos os dias a encontro no interior do Palácio. Percorre tudo como que ainda procurando a sua antiga e real dona. Toda coquette e luzidia, é ela ainda a senhora absoluta dos aposentos mais luxuosos do castelo. Nos appartements da rainha, ela passa o melhor da sua vida, prefere-os a todos os outros”, escreveu Augusto Barreto, que viveu no Palácio da Pena após a queda da monarquia.

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Com a partida da sua dona, Gatita continuou a ser alimentada por antigos empregados da Família Real e a viver tranquilamente no Palácio. Quando este era visitado, Gatita era o centro das atenções. Houve até quem tentasse ficar com ela: num outro artigo escrito para o mesmo jornal em novembro desse ano, Augusto Barreto conta a história bizarra de uma senhora francesa que queria a todo o custo levar a gatinha para Toulouse, aquando da sua estadia em Sintra para participar no Congresso Internacional de Turismo. “Pedia-me para a levar para essa cidade do sul de França. Amavelmente disse-lhe que não, o que ela não me perdoou, porque enquanto esteve na Pena, diversas vezes me fez o mesmo pedido, de uma forma bem cruel”, recorda o responsável. Não podendo ficar com o animal, a senhora decidiu levar outra lembrança: “No baile da Câmara de Lisboa em honra dos turistas, quando estava num dos salões, uma dama em traje branco de gala dirige-se-me a perguntar de chore, em puro francês, pela gata. Reconheci logo a francesa de Toulouse. Respondi-lhe que estava boa; e depois de várias conversas, convidei-a para uma valsa. Ao despedir-me, agradecendo-lhe, ela, com uma graça toda francesa, disse-me: “Não me quis dar a linda gata, mas eu tenho della uma bela lembrança”. E numa risada sumiu-se”, descreve Augusto Barreto que, mais tarde, descobriu que a coleira de prata da Gatita tinha desaparecido.

Gatita

Com ou sem coleira, a pequena gata continuava a ser dona e senhora do seu Palácio, sempre na esperança de voltar a ver a sua dona: “As poucas vezes que sai à rua, procura sempre os pontos mais altos para avistar o horizonte. Quando a vejo a fitar o mar, lembro-me, e creio, que ela é a única amizade que a sua dona aqui deixou, e que de tantos que a bajularam e serviram, nenhum se lembra mais da rainha Amélia que a sua Gatita; e quem sabe se na sua vista de lince, olhando o mar, ela sentirá mais que ninguém a saudade de tão brusca separação. E é por isso que a régia gata espera ainda a dona, para poder saborear de novo o fino camarão da Barra e os doces biscoitos da City”.