A história da princesa demorava "três quartos de hora" a tomar chocolate
07 jul. 2023
O chocolate era uma das iguarias preferidas dos reis e rainhas portugueses – este doce tinha sempre lugar à mesa real.
No século XVIII, o chocolate era servido de várias formas. Quando visitar o Palácio Nacional de Queluz, encontrará na Sala das Merendas alguns objetos que sugerem o gosto da família real por este doce: existe uma chocolateira de porcelana, que fazia parte do serviço de D. Pedro III, encomendado especificamente para aquele palácio; E uma chocolateira de prata, que tem um molinete, uma peça que servia para mexer o chocolate e, assim, fazer com que este não ficasse muito grosso no fundo do recipiente.
Mas nem todos comiam chocolate num ápice – havia uma princesa que dava verdadeiras dores de cabeça às suas aias logo pela manhã. Antes de saber porquê, fique a conhecer a sua história.
Carlota Joaquina de Bourbon nasceu em Aranjuez, em 1775. Era a filha primogénita de Carlos IV de Espanha – era, por isso, imprescindível que tivesse um bom casamento. Assim, com apenas 10 anos, casa-se com o infante D. João, filho da rainha D. Maria I de Portugal, fortalecendo os laços entre as nações vizinhas.
Carlota Joaquina era, na verdade, uma criança quando chegou a Portugal. E, como todas as crianças, tinha as suas ‘birras’. Uma delas era precisamente por causa do chocolate que tinha de tomar ao pequeno-almoço. “(...) Esta manhã para se calçar, colocar o espartilho e tomar o chocolate, [a princesa] esteve desde as 8 até às 10 horas; por mais que lhe dissessem para se despachar, não reagia e ainda se demorava mais; enquanto tomava o chocolate, estava também a infanta D. Mariana, que disse esta manhã que nunca na sua vida tinha visto alguém levar tanto tempo para tomar o chocolate, pois demorou mais de três quartos de hora (…)”, lê-se numa carta escrita em outubro de 1785 por Ana Miquelina, aia da princesa Carlota Joaquina, para sua mãe, Luísa de Parma, Princesa das Astúrias.
A verdade é que, apesar de Carlota Joaquina aparentar não ser fã desta iguaria, o resto da família real adorava deliciar-se com um bom chocolate. De tal forma que, anos mais tarde, no século XIX, a o hábito de tomar chocolate quente foi levado para o Palácio da Pena, onde reis, rainhas, príncipes e princesas passavam férias. Se visitar a cozinha deste palácio, verá que, por entre tachos, panelas, travessas e frigideiras, encontrará também chocolateiras.
Quanto a Carlota Joaquina, a vida acabou por tomar rumos um pouco mais amargos. Com apenas 13 anos, torna-se rainha de Portugal (mulher de D. João VI), mas isso não significa que tenha tido uma vida fácil. Viveu períodos conturbados da História de Portugal, como as invasões francesas e a fuga da família real para o Brasil, em 1807. De regresso a Portugal, Carlota Joaquina ficou com o Palácio de Queluz praticamente só para si, mas pelas piores razões: a rainha viveu exilada e vigiada pela polícia secreta do rei, entre Queluz e a Quinta do Ramalhão, por se ter recusado a jurar a Constituição Liberal e continuar associada ao movimento absolutista, conspirando contra o Rei e apoiando o filho D. Miguel. Ali passou os últimos anos da sua vida, acompanhada pelas filhas mais novas e pela princesa viúva D. Francisca Benedita. Morreu no Palácio de Queluz, em 1830, e foi velada na Sala do Trono, onde foi colocada em câmara ardente.